segunda-feira, 21 de novembro de 2011

A culpa

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Hoje me deterei sobre um sentimento recorrente nas famílias e especialmente vivido pelas figuras parentais.

Melhor informados que nunca, os pais têm tremenda responsabilidade. Procuram dar o melhor de si para fazer face às demandas dos seus filhos. Porém atender à lista de tarefas é impossível. Então, a culpa carcome os mais conscientes e é um sentimento com o qual os pais estão intimamente familiarizados.

A clínica nos comprova que quem foi criado em um entorno culposo tem a tendência de sentir-se assim quando adulto. Aprendem a sentir culpa numa idade precoce e este conceito continua a menos que seja confrontado. Tem mais: os pais com esse tipo de antecedentes são mais propensos a utilizar as culpas dos seus filhos para obter deles o que precisam. “Deverias ter vergonha” é uma reprimenda vinda dos pais que cala fundo na auto-estima da criança.

Nem todos pensam tratar-se de um sentimento daninho. Um experimento da Universidade IOWA identificou os mecanismos que ajudam as crianças a converterem-se em adultos capazes de serem respeitosos e terem consideração. Em verdade, foi aplicado um teste que consistia em entregar a uma criança, um brinquedo supostamente valioso e era-lhe explicado que aquele brinquedo havia atravessado gerações. Previamente, o brinquedo havia sido danificado para que ao pegá-lo este se quebrasse nas mão da criança. Soa cruel, não? Mas o propósito não era de cimentar.

Uma personalidade traumatizada, mas de medir este sentimento, passível de ser descrito como “um aperto no estomago”. O usual é que a culpa passe a fazer parte de nossa vida, por volta dos dois anos. Segundo Grazyna Konchanska, que vem estudando o desenvolvimento infantil nos últimos 20 anos (também em IOWA) se demonizarmos a culpa, estaremos frente a seres incapazes de sentir empatia, como acontece com os psicopatas.

Ainda que menos grave, uma baixa capacidade de considerar o outro se instala nessas crianças que ferem seus companheiros de classe ou seus brinquedos. O temperamento que trazem desde os dois anos predispõem alguns a experimentarem a culpa. Entretanto para outros esta emoção vai apoderando-se deles como conseqüência de sua matriz formadora. A culpa colabora com o controle de impulsos.

Não obstante, pesquisadores de outra universidade (George Mason) fracassam no propósito de conseguir unir as habilidades dos pais para criar filhos com os mesmo níveis de culpabilidade que eles mesmos traziam.

June Tangney, psicóloga, destaca no artigo A chave é diferenciar a vergonha da culpa: “A culpa pode nos soterrar do ponto de vista do comportamento, mas também pode ser produtiva”. Segundo ela, a maioria das crianças não distingue entre “Filho fizeste algo mau!”; “Filho você é mau!”. Tendem a ouvir: “Menino mau!”

Vale salientar que a culpa não é algo específico dos pais. Normalmente, quem sente que tem uma tarefa pela qual é responsável e as coisas não saem como ele ou as outras pessoas esperam, a primeira coisa a fazer é acusar-se. Nos pais isso se acentua, porque o que está em questão é uma pessoa que ademais é seu filho.

Existem dois planos possíveis de auto-acusação: um real e um imaginário. Um muitas vezes se incrimina por haver feito coisas que estão somente dentro da cabeça: "Olhei e então aconteceu tal coisa!” Porem isso é algo que só funciona internamente, impossível de demonstrar. A outra culpa, a real,s e processa de maneira distinta: sente-se culpa por coisas que derivam do que o objeto em questão significa para eles. Por exemplo: pais em relação aos filhos. Certamente, a maior parte ama seus filhos, porém todo ‘querer’ é ambivalente. Quero dizer que aglutina sentimentos contraditórios, ou seja, ama-se o filho, mas também tem-se raiva que esse filho tenha uma vida que vai sucede-la, que vai ser mais extensa, que vai ter experiências que os pais não chegaram a ter.

Surge a seguinte questão: A culpa pode ser provocada pela inveja? Provavelmente é sua grande fonte! Isso que dizer que mesmo escandalizando boa parte da população de pais, eles invejam seus filhos! Porém, não é menos correto afirmar que os filhos invejam os pais!
Afinal o que se quer dizer com a palavra I N V E J A, neste caso? Fala-se de um mal estar, uma raiva diante do que tem o outro. Ter no sentido de possessão material, mas também em qualidade. Mesmo que não haja um valor objetivo. Por exemplo: raiva, inveja da independência do outro.

Observamos assim pais repletos de culpa quando as coisas saem mal para os filhos, ou com eles. E muitas vezes, num processo inconsciente se transforma o sentimento em atos.
Amy Chua, rofessora de Direito em YALE escreveu um polemico livro (Hino de batalha da mãe tigre) em que defende: “se uma criança não consegue boas notas é por culpa dos pais que não conseguiram educá-la corretamente”.

“Não assuma que seu filho é débil. Ou que não pode lidar com qualquer coisa”.
“O que os pais chineses entendem é que nada é divertido até que se acerte fazê-lo bem.”
“Para ser bom em alguma coisa tem que trabalhar. E as crianças por si mesmas nunca querem trabalhar, por isso é crucial ignorar suas preferências.I sto freqüentemente, requer força de vontade por parte dos pais, porque a criança resistirá.”

“As coisas são sempre mais difíceis no começo, que é quando os pais ocidentais tendem a render-se. Porém se é bem feita a estratégia gera um círculo vicioso: Prática tenaz, prática e mais prática,i sso é crucial para a excelência do fazer.”

Ameaças como, doar todos os brinquedos à instituições de caridade, fazem parte do método de Chua,claramente distinto do que reina no ocidente, desde o pós guerra, quando crianças passam a ser o centro da casa e os pais os responsáveis por qualquer eventual contratempo.

Gostaria aqui de lançar um olhar sobre a culpa que se esconde por trás da permissividade.
A criança passou de um ser esquecido para a condição de ‘umbigo’ da casa.Todos(as) estão ao seu serviço.Deve-se protegê-los e dar-lhes todas as coisas possíveis .Os pais muito freqüentemente tornam-se escravos dos filhos.Qualquer desejo dos filhos devem ser satisfeitos ,por medo ao dano que possa causar . Além disso os pais procuram se treinar,fazer cursos,ler livros especializados,etc. Até ai,todo bem! O problema é que na prática fica difícil saber em que momento aplicar tais conhecimentos.

Converter a criança em um ditador da casa, pode ser uma estratégia para evitar sentir-se culpados.Não estariam assim subtraindo dos filhos ,a capacidade de desenvolver a própria culpa e resistir a frustrações?

Está latente, ao mesmo tempo,o medo de não ser tão bom pai/mãe como se aspira,o orgulho próprio e a eventuais acusações dos outros,Assim como,o sentimento de competição com outros pais.

Não podemos esquecer que além dos possíveis conflitos com seus filhos o pai e/ou a mãe, também tem conflitos com seus próprios pais.è fácil observar os jogos de disputa e rivalidade entre eles:”Eu sou muito melhor pai/mãe que meu pai/mãe.” Assim podemos nos sentir triunfando diante do pai/mãe.Esse triunfo arruína a imagem do pai/mãe.E pode levar a culpa por haver exagerado nos defeitos deles e nas próprias virtudes.A culpa esta em tudo.É um tema que remete ao passado e avança no futuro,perpassando todas as relações que envolvem as figuras parentais.

Por fim, um trecho da letra de uma música de Paulinho Moska, O Jardim Do Silêncio,c omo uma proposta para reflexão:

A VIDA NÃO PEDE LICENÇA
E MUITO MENOS DESCULPA.
O PERDÃO É QUE FAZ POSSÍVEL
O NASCIMENTO DA CULPA.